sexta-feira, 19 de outubro de 2007

É possivel a pena de "castração química"?


No Senado e na Câmara Federal existem propostas para alterar o código penal brasileiro acrescentando um novo tipo de pena: a castração química.
Alegam os seus defensores, o deputado federal Mendonça Prado e o senador Gerson Camata, que aplicação de drogas que reduzem o hormônio masculino seria a solução para os autores de crimes sexuais, principalmente os pedófilos.
No clima de violência generalizada e do aumento dos crimes de pedofilia, a mídia com certeza, sem entrar em um debate técnico-científico, apoiará as propostas pois contam de saída com o gosto de vingança.
A repercussão na mídia terá um efeito na população de um modo geral de resgatar o sentimento de retribuição da pena, ou seja, de fazer o autor do delito"pagar" de algum modo e preferentemente de forma gravosamente proporcional ao mal praticado.
Duas questões surgem:
1.a primeira de natureza constitucional, e a pergunta seria sobre a constitucionalidade da proposta. A princípio a nossa Constituição proibe o estabelecimento de penas cruéis - inciso XLVII, do art. 5º - e, também, garante a integridade física e moral dos presos - inciso XLIX, também do art. 5º. O significado de "penas cruéis" é amplo e certamente vingando a proposta legislativa, o STF será provocado para definir se a "castração química" seria considerada pena cruel. Do mesmo modo, há de se discutir se a pena em comento vindo a se tornar lei não fere a integridade física do apenado.
2. a segunda questão é de natureza criminal e envolve não somente a análise criminológica, mas também os aspectos clínicos e será imprescindível a contribuição dos especialistas médicos das áreas da endocrinologia e psiquiatria, além da psicologia, para verificar se a redução hormonal efetivamente seria uma resposta ao problema. É sabido que alguns tratamentos hormonais podem causar doenças, inclusive o câncer. Além do que a questão do "desejo sexual" não é simplesmente uma questão bioquímica, pode ser também de natureza psicológica, e não impedirá que o "castrado quimicamente" venha novamente cometer delitos sexuais.

O debate está apenas começando e é importante que os profissionais das áreas afins sejam ouvidos e a discussão não fique apenas no plano emocional.

É importante que a opinião pública não se limite a transformar a solução penal como única para os casos de violência sexual. O Estado brasileiro tem a obrigação de cuidar da saúde física e mental dos seus cidadãos, portanto, em boa parte dos casos de violência sexual estamos diante de pessoas com transtornos mentais que necessitam de tratamento médico adequado e não apenas da aplicação de penas.

Concluindo, ainda que seja ultrapassada a questão da constitucionalidade, existirá a questão médica que não deve se limitar a uma opinião.

quinta-feira, 11 de outubro de 2007

Estado Policial versus Estado de Direito


Aconteceu em São Paulo, de 08 a 11 de outubro, o 13º Seminário Internacional de Ciências Criminais promovido pelo Instituto Brasileiro de Ciências Criminais, e um dos temas centrais tem sido a discussão sobre o reflexo do medo da sociedade e do papel da imprensa no mundo inteiro para o retrocesso grave no uso do direito penal como instrumento de contenção da criminalidade e da violência.
Um dos mais respeitados criminalistas da Espanha, José Luis Díez Ripollés, da Universidade de Málaga, criticou duramente o uso pelos políticos de todas as tendências de criar cada vez mais leis muito duras no sentido penal e que não resolvem o problema da criminalidade comum em face do terrorismo, especialmente após o 11 de setembro de 2004 em New Yorque, nos Estados Unidos.
Não se pode negar que, principalmente nos países de baixa criminalidade e de alto poder aquisitivo, a resposta dada a ameaça do terrorismo seja da Al Quaeda ou de outro grupo qualquer, inclusive os locais como o caso do ETA na Espanha e das FARC na Colômbia, provoca uma histeria nos políticos que buscam atender a opinião popular objetivando muito mais garantir os votos dos eleitores do que mesmo contribuir na luta contra essas formas de violência. Primeiro porque os políticos desconhecem a questão da violência e também não conseguem distinguir os fatores, as nuances e as soluções para questões diversas: a criminalidade e a violência em sentido amplo, e colocam tudo no mesmo plano. Segundo porque os objetivos imediatistas do encarceramento e do endurecimento das medidas de controle não respondem de maneira eficiente aos problemas existentes.
No Brasil o problema é mais grave porque além do populismo político, de uma imprensa sem especialização e sem um preparo intelectual para discutir os temas da criminalidade e da violência com raras exceções, se soma até mesmo membros do ministério público, magistrados e advogados, que defendem o endurecimento das penas sem analisar as conseqüências em um país que tem um dos piores sistemas carcerários do mundo e que não possui políticas sociais para combater a miséria, e nem políticas criminais claras para combater a violência da corrupção nos altos escalões dos poderes, na polícia e nos presídios.
Beira a irresponsabilidade a defesa da redução ou do desrespeito às garantias constitucionais em nome da segurança e da ordem, apenas um sofisma, uma deslavada mentira, que mantém afastada a verdadeira responsabilidade criminal de atores importantes.
Evidencie-se que não se deve fazer proselitismo quando se defende as garantias constitucionais, não é o respeito a essas garantias que dificultam o combate ao crime, o que torna difícil no combate ao crime é o envolvimento cada vez maior das camadas mais abastadas e poderosas da sociedade, os mesmos que muitas vezes defendem o endurecimento das penas, mas para os outros.