quarta-feira, 20 de junho de 2007

A República passada a limpo

A história do Brasil desde o seu descobrimento revela o quanto esta terra sofreu de vilipêndios e achaques.

No início da colonização os legítimos senhores desta terra foram espoliados, massacrados, dizimados pelo europeu que aqui chegara com sua cultura e com a sua postura de superioridade, como registram os escritos da época da lavra daqueles que tinham o ponto de vista do colonizador para quem os indígenas eram apenas seres bárbaros e incivilizados.

Uma vez tendo o Rei de Portugal decidido pela colonização desta terra o que se assistiu foi um verdadeiro processo de privatização onde através das chamadas Capitanias Hereditárias, nobres portugueses receberam imensas áreas do território brasileiro e em troca pagariam as taxas e impostos à coroa portuguesa.

Falidas as capitanias se institui por força de decreto real a estatização do prejuízo com a chegada do primeiro Governador Geral do Brasil, Estácio de Sá.

Graças ao império napoleônico a família real portuguesa à frente D. João VI, fugindo da inevitável invasão francesa, vem de malas e cuias para a colônia da América do Sul, e aqui instala o governo do Reino Unido de Portugal e Algarves. Abrem-se os portos brasileiros para o mundo, surgem as primeiras faculdades e o Brasil começa a se preparar para ser estado.

A independência do Brasil como fruto muito mais de conveniência política do que de paixão pelo país leva o herdeiro do trono de Portugal a ser coroado como primeiro Imperador do Brasil. Não foi sem motivo que Pedro I abdica do trono brasileiro e vai lutar contra o seu próprio irmão para garantir o trono de Portugal para a sua filha, e assim, antes de morrer no Palácio de Queluz onde nasceu, vê realizado o seu intento: seus dois filhos reinando em Portugal e no Brasil.

A República brasileira nasce muito mais da insatisfação da elite econômica do Brasil do fim do século IX com o Imperador Pedro II, culminada, principalmente pelo fim da escravidão no país do que pela consciência dos poucos defensores ideológicos do sistema.

Assim, o Brasil republicano viverá crise sobre crise todas as vezes que a elite de algum modo se sentiu desprestigiada e desprotegida em seus interesses.

O espírito republicano brasileiro, como bem poderia dizer Oliveira Viana, reflete os interesses da elite econômica da vez. Uma hora, os cafeicultores, em outra, a elite industrial, bem mais recente a elite das empreiteiras, a elite dos bancos, a elite dos grandes conglomerados, a elite das multinacionais.

Nesse embalo, o sentido de república, ou seja, de coisa de todos, se transforma em coisa de alguns poucos. Os mesmos que continuam a eleger os governantes e os legisladores do país.

As crises provocadas pelas revelações das relações incestuosas entre membros dos poderes da República, em todos os níveis, são provas inequívocas de que a velha república continua velha e atuante.

Passar a república a limpo é resgatar o sentido romano da “res publica”, de coisa de todos, da sociedade, dos cidadãos, e não apenas dos que fazem da coisa pública seu universo particular, com a permissão de Marisa Monte.

sexta-feira, 1 de junho de 2007

Golpe na democracia participativa

Corre no meio da advocacia sergipana uma notícia de que a OAB-SE está prestes a dar um golpe na democracia participativa na escolha da lista dos seis advogados que seguirá para o Tribunal de Justiça onde serão escolhidos os três nomes que comporão a lista que será enviada ao governador do estado, cumprindo o ritual de escolha da vaga de desembargador da classe dos advogados com aposentadoria do desembargador Paschoal Nabuco.

A lição do maior constitucionalista brasileiro, Paulo Bonavides, por sinal, medalha Ruy Barbosa, a maior comenda da Ordem dos Advogados do Brasil, é de que as instituições e o estado brasileiro devem preservar e garantir a democracia participativa, única forma de se evitar desvios da representação.

No caso da OAB-SE, efetivamente se houver a concretização da notícia de que após a adoção da democracia participativa por iniciativa do Conselheiro Cezar Brito na OAB de Sergipe, atualmente Presidente do Conselho Federal, onde todos os advogados em eleição direta escolhiam os seis nomes de advogados para concorrer à vaga de desembargador, fato que levou, por exemplo, o desembargador Roberto Porto à lista, por razões ainda não conhecidas, retorne a escolha pelo colegiado.

A escolha da lista dos seis advogados apenas pelos conselheiros da OAB-SE não se constitui numa ilegalidade ou numa inconstitucionalidade, porém abalará a credibilidade daquela instituição como defensora intransigente da democracia, tradição que se firmou especialmente no período da ditadura militar, sofrendo inclusive atentados, um deles causando a morte da secretária Lyda Monteiro.

Poderá, ainda, deixar evidente a existência de interesses outros, pequenos e de política comezinha, contra a democracia, um verdadeiro golpe à moda dos ditadores latino-americanos.

Não creio que os advogados sergipanos que compõem o atual Conselho da OAB em Sergipe, muitos com tradição de luta pela democracia, apóiem uma atitude que deixará uma mácula na história dos advogados sergipanos.

A minha crença, como constitucionalista, é que a sociedade brasileira, e, em particular, a sergipana, sempre avançará democraticamente à medida que suas instituições também trilharem o caminho da democracia participativa, a exemplo da OAB-SE.